ALTO PARAÍSO (GO) E RIO - Sem um quartel local do Corpo de Bombeiros, habitantes da Chapada dos Veadeiros se organizam em grupos para apagar as chamas que ardem desde domingo na região e até ontem haviam atingido 14 mil hectares. Além de brigadistas voluntários, que residem na chapada, há donos de pousada, de espaços de lazer e caseiros que vão para o front impedir que o fogo avance ainda mais na vegetação e chegue às casas, enquanto hóspedes e visitantes deixam a região com medo.
Foi assim na ecopousada Toca do Guará, próxima à Serra do Segredo, e onde há 11 casas nos arredores. Para impedir que as chamas ultrapassassem a barreira do Rio São Miguel, que corta a serra, moradores vizinhos aplicaram a técnica do contrafogo, que deve ser bem calculada para evitar mortes e ferimentos de humanos e animais: iniciaram uma queimada para encontrar as chamas do incêndio original. Assim, um consome o outro.
— Muita fumaça, muita fuligem, hóspedes chegando aqui e indo embora com medo. A gente devolve o valor da reserva. É bem atípico isso: em 15 anos, aqui queimou três vezes — descreve o proprietário Marcos Pitombo, pai adotivo do ator homônimo da novela “Salve-se quem puder”.
Pitombo teve quatro reservas canceladas em três dias por causa do incêndio, duas por antecipação. O prejuízo chega a quase R$ 4 mil. Ainda não é possível medir as perdas florestais e econômicas na região. Comerciantes confirmaram outras reservas canceladas.
Em uma fazenda que é reserva particular perto do Vale da Lua, cerca de 70 dos 77 hectares foram atingidos pelas chamas. Bombeiros e brigadistas do ICMBio tiveram a ajuda de um avião para debelar o fogo.
— É muito íngreme essa área, é mais difícil de apagar — diz o proprietário, Filipe Currey.
Combate difícil
De quarta para quinta-feira, mais 3 mil hectares queimaram. A fumaça, a fuligem e a poeira dão um tom ora cinza, ora marrom à paisagem em meio às temperaturas que alcançam 35°C, à umidade abaixo de 12% e aos ventos fortes. O cenário não só favorece o espalhamento das chamas, mas também dificulta o trabalho de conter o fogo.
— Hoje a gente teve um dia de combate bom pelas brigadas do ICMBio e do Prev-Fogo. Foram mais de 4km de linha que a brigada combateu em três horas — calcula o chefe do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, Luís Neves.
Ao todo, cerca de 200 pessoas estão envolvidas no combate às chamas, entre integrantes da Brigada Voluntária São Jorge, agentes da Prev-Fogo, bombeiros e servidores do ICMBio. A suspeita entre eles é de que o princípio do incêndio tenha origem criminosa.
— Se está pegando fogo, é porque alguém colocou — acusa um brigadista voluntário que se queimou durante o trabalho e prefere preservar a identidade. — Quem coloca o fogo nessa época não entende o sofrimento que causa.
De acordo com Secretaria de Meio Ambiente de Alto Paraíso, o Parque Estadual Águas do Paraíso e a Cachoeira do Segredo, dois pontos turísticos bastante procurados, devem reabrir hoje. Já o Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, não atingido pelas chamas, segue em funcionamento.
Projeto criticado
Moradores da região também criticam o Projeto Gênesis, anunciado pelo governo goiano na semana passada, que prevê museus e um teleférico no Parque Estadual Águas do Paraíso.
Nas redes sociais dedicadas à Chapada dos Veadeiros, o projeto foi chamado de “megalomaníaco e de alto impacto ambiental”.
A secretária de Meio Ambiente de Goiás, Andréa Vulcanis, diz que as intervenções não vão representar mais de 2% da área dos 5,6 mil hectares do parque estadual.
— Estão chamando por aí de estruturas megalomaníacas, mas não sabem nem o tamanho — critica.