Era uma manhã tranquila na casa de Maurício Assunção, bombeiro da reserva há nove anos. Na cozinha, a esposa preparava o almoço quando ele resolveu ligar a televisão para acompanhar as notícias. A manchete em todos os jornais era a de que um prédio residencial havia desabado no bairro Dionísio Torres, em Fortaleza. Em poucos segundos, a história do Edifício Andréa virava escombros. Os telejornais mostravam os bombeiros tentando resgatar vidas sob o que sobrou da edificação.
“Naquele momento o sangue correu forte nas veias, procurei alguma farda e fui até o local”, contou sargento Assunção vestindo um uniforme empoeirado, mas com muita disposição, quando já se passavam mais de 100 horas da operação de resgate das vítimas.
Ele foi um dos voluntários da maior operação já realizada pelo Corpo de Bombeiros no Ceará. “Foi a maior, porque tínhamos uma enorme estrutura colapsada e deveríamos executar nosso trabalho no menor espaço possível de tempo para resgatar todos com vida”, relatou o comandante geral do Corpo de Bombeiros, Eduardo Holanda. “Tomei um susto quando vi o Assunção. Assim como ele, se juntaram bombeiros que estavam de folga no Interior e grande parte do nosso efetivo da Capital e Região Metropolitana”, comentou.
Entre os 130 bombeiros que se revezavam 24 horas para socorrer as vítimas, estava o cabo Alexandre Moura, um dos primeiros a chegar ao local: “A gente luta para dar a resposta mais rápida e eficiente para as famílias das vítimas”. E uma das famílias a receber notícia de que um parente foi encontrado com vida foi a do universitário Davi Martins. “Escavamos dois metros e meio durante quase três horas até encontrá-lo com vida. Quando peguei na mão dele e ouvi um ‘obrigado’ o coração bateu forte”, revelou, emocionado.
Especialista em Busca e Resgate em Estruturas Colapsadas, a tenente Carolina Campos também atuou na operação desde os primeiros instantes. “Por mais cansada que a gente fique em uma ocorrência como essa, queremos continuar para resgatar todos”, relatou. Para ela, a principal dificuldade foi “montar o quebra-cabeça” e descobrir a localização das vítimas no meio dos escombros.
Para isso, um time sem fardas foi fundamental: os cães farejadores do Corpo de Bombeiros. Uno, Anne, Kelley e Sultão se revezaram para apontar onde as vítimas do Edifício Andréa estavam em meio àquele monte de escombros. “O cão, em uma situação como essa, enxerga e fareja aquilo que o homem não é capaz de fazer. É a melhor ferramenta de detecção e localização de vítimas”, explica o coronel Lino Rodrigues. Com 29 anos no Corpo de Bombeiros, Lino revela que jamais tinha passado por uma situação parecida.
Assim como Bruna Sobral. Devido à gravidade da situação, ela e todos os demais alunos do Curso de Formação dos Bombeiros foram convocados para ajudar no resgate. “Só pedia a Deus todos os dias para poder me usar a fim de diminuir o sofrimento das famílias”, confessou. Questionada se não estava cansada depois de quase 100 horas de operação, Bruna foi enfática: “Não tem cansaço, enquanto tiver fôlego estarei aqui”.
E assim ela permaneceu. Bruna, Lino, Carolina, Moura, Holanda, Assunção e cerca de 500 pessoas que estiveram envolvidas diariamente no resgate após a tragédia do Edifício Andrea. Eram bombeiros, policiais, profissionais da Defesa Civil, psicólogos, comerciantes, terapeutas ocupacionais e centenas de anônimos que trabalharam intensamente durante cinco dias para retirar vítimas. Infelizmente, nove pessoas perderam a vida, outras sete foram resgatadas e puderam abraçar seus familiares.
Foram 103 horas de operação. Dias de angústia, desespero, dor, lágrimas… Mas também dias de esperança, fé e de muita união. Uma grande corrente de solidariedade foi formada em torno das famílias e dos profissionais que se revezaram dia e noite com o único propósito de salvar vidas. “Vimos de perto a maneira como todos queriam continuar trabalhando de forma incansável”, testemunhou a fisioterapeuta voluntária Érika Nobre, que organizou junto com outros profissionais uma equipe para fazer massagens e outros procedimentos terapêuticos nos bombeiros que atendiam à ocorrência. “Foram pessoas que largaram seus consultórios, desmarcaram pacientes, com o intuito de ajudar”, comentou. Assim como os fisioterapeutas, pessoas passavam a toda hora oferecendo água, bebidas energéticas, alimentos ou até mesmo um singelo desejo de bom trabalho ou boa sorte. Se os bombeiros eram máquina, os voluntários foram combustível da história do resgate do Edifício Andréa.
No calendário, 15 de outubro é Dia do Professor. E foi justamente naquela data que os cearenses deram uma lição de dedicação, solidariedade e amor ao próximo.