Na última semana, o governo encaminhou à Assembleia Legislativa um pacote amplo de mudanças com tramitação acelerada. Entre as propostas, destacam-se o Projeto de Lei Complementar nº 465/2025, que reestrutura a Polícia Penal com criação e reorganização de cargos e funções, e o Projeto de Lei Complementar nº 464/2025, que autoriza que Delegados de Polícia da 4ª Classe, Comissários de Polícia e Comissários de Investigação Policial, já aptos à aposentadoria especial voluntária e que optem por permanecer em atividade, deixem de ocupar vaga no respectivo quadro funcional, destravando movimentações e promoções internas. Trata-se de uma vitória e de avanços concretos para as categorias contempladas, que ganham previsibilidade de carreira e maior mobilidade institucional, o que se espera de uma instituição verdadeiramente independente.
O pacote, embora represente grandes avanços para corporações específicas, reacende o debate sobre prioridades e alocação de recursos em plena vigência de restrições fiscais (em tese). Em contraste, o Corpo de Bombeiros Militar do Rio Grande do Sul continua operando com efetivo abaixo do necessário para a demanda real da população, mesmo após a maior tragédia climática da história do Estado, quando se evidenciou, de forma incontestável, a urgência de recompor pessoal, capacidade de resposta e cobertura territorial. Diante desse contraste, torna-se imprescindível discutir números, metas e caminhos para recompor a força de trabalho do CBMRS com critérios técnicos e prazos factíveis, de modo a garantir resposta rápida, segurança operacional e cobertura mínima em todo o território.
Hoje o CBMRS, mesmo que o quadro esteja completo, não consegue cumprir nem com os padrões mínimos previstos em normas técnicas internacionais a respeito do seu quociente de efetivo. Pondo de forma simples, as normas da NFPA (National Fire Protection Association), normas adotadas como referência internacional, especificamente a NFPA 1710, orienta que cada viatura de combate a incêndio deve sair com equipe mínima de quatro bombeiros. A cobertura do território precisa garantir que as guarnições cheguem rápido e em número suficiente para dominar o fogo com segurança. Como regra prática, cidades menores operam com 1 a 1,5 bombeiro por mil habitantes; cidades médias, de 1,5 a 2 por mil; e grandes centros, de 2 a 2,7 por mil. Trazendo isso para o Rio Grande do Sul, com cerca de 11 milhões de habitantes, mesmo um patamar conservador de 0,6 por mil já indicaria algo próximo de 6,6 mil bombeiros; a 0,8 por mil, seriam 8,8 mil; e a 1 por mil, 11 mil. Esses números não são um luxo: traduzem o mínimo de Bombeiro Militar por turno para garantir saída imediata, atendimento simultâneo e segurança da tropa e da população.
Em condições plenas de efetivo, cada ocorrência relevante deveria mobilizar um “trem de socorro” mínimo: uma guarnição de combate ao fogo com quatro bombeiros, uma guarnição de atendimento pré-hospitalar com três bombeiros, conforme prevê a portaria 2.048/02, e, ao mesmo tempo, um operador de comunicações permanecendo no quartel para coordenar novas chamadas e apoio, uma realidade distante hoje para muitos pelotões onde há guarnições compostas por apenas três bombeiros. Essa é a fotografia da saída padrão, mas a escala real precisa considerar férias regulamentares, licenças, cursos, afastamentos por saúde e trocas de turno para que nunca falte gente. Soma-se a esse cálculo o período da Operação Verão, entre dezembro e março, quando parte do efetivo é deslocada para atividades de guarda-vidas no litoral e em águas internas, elevando a demanda por pessoal sem reduzir as emergências nas cidades.
Há ainda um fenômeno que distorce o retrato do efetivo: a terceirização do estado para que entidades de cunho privado executem o desempenho da atividade de bombeiro, prevista constitucionalmente como competência dos Corpos de Bombeiro Militar, assim como pela Lei Orgânica Nacional das Polícias e Corpos de Bombeiro Militar, Lei 14.751/23, pois mesmo nas categorias de bombeiros civis, voluntários ou comunitários, estes precisam ser devidamente conveniados, treinados e fiscalizados pelos Corpos de Bombeiros de cada Estado, algo que ocorre apenas em parte no RS.
A quem interessa manter o CBMRS reduzido?
A quem pode interessar que o CBMRS não cresça?
Enquanto o Estado cria cargos e amplia estruturas em diversas áreas, sempre que se fala em reestruturar o Corpo de Bombeiros reaparece o argumento de que o Regime de Recuperação Fiscal impede avanços. O paradoxo é maior quando esse discurso parte justamente de quem deveria se empenhar ao máximo pelo desenvolvimento dos recursos humanos do CBMRS. Nos próximos meses, a admissão de cerca de 950 militares, entre carreira e temporários, é um alento para quem hoje sai com dois combatentes e um condutor na ocorrência ou precisa escolher entre atender um incêndio ou um acidente veicular. Ainda assim, distribuído pelo território e pressionado pelo administrativo, esse reforço não chega a nove militares por pelotão.
Uma estruturação robusta exige cumprir a LON: metas por habitante, escalonamento vertical, calendário permanente de formação e revisão da lei de fixação de efetivo. Sem isso, seguiremos remendando a escala. Aqui mora o risco: escala reduzida significa maior desgaste físico e emocional da tropa, aumento do erro operacional e elevação do risco de acidente em serviço, quando o que a sociedade precisa é de resposta simultânea, segura e previsível.
Baseado no exposto, registramos aqui o nosso pleito e solicitamos veementemente ao Governo do Estado e a Egrégia Assembleia Legislativa:
1-Emenda ao Projeto de Lei Complementar nº 464/2025, que autoriza que Delegados de Polícia da 4ª Classe, Comissários de Polícia e Comissários de Investigação Policial, estendendo o proposto no texto aos últimos níveis das demais carreiras da segurança pública, em especial aos 1º Tenentes QTBM e aos Coronéis QOEM, fazendo com que a carreira do atual do CBMRS possa destrancar;
2- Protocolo em regime de urgência, de um projeto de lei específico para o CBMRS de reestruturação aos moldes do Projeto de Lei Complementar nº 465/2025, que reestrutura a Polícia Penal com criação e reorganização de cargos e funções, ajustando a estrutura do CBMRS ao previsto na Lei 14.751 de 12 de dezembro de 2023 (Lei orgânica Nacional da PM e BM) em especial com retomada de antigos cargos (postos e graduações) hoje extintos, aumentando assim o efetivo previsto do CBMRS, dando maior fluidez na carreira e mais qualidade e segurança no atendimento de ocorrências;
ABERGS
Unidos em um só corpo, Corpo de Bombeiros!

