A resposta é tão simples que não há espaço para polêmicas. Policial e bombeiro são profissões diferentes. Polícia previne e investiga crimes. Bombeiro salva vidas em perigo.

O fato de serem militares não justifica a administração única. Partindo deste rasteiro raciocínio poderíamos afirmar que bombeiros militares ficariam subordinados à Polícia Militar e bombeiros civis à Policia Civil.

A hierarquia e a disciplina do Bombeiro Militar e da Polícia Militar os fazem iguais na forma de administrar, mas não modificam a natureza do seu ofício. A formação de um policial está afeta a área das humanas e a do bombeiro às exatas.

Vou apresentar dois exemplos profissionais, um na área civil e o outro na militar, para consolidarmos este entendimento.

Médicos se especializam em cardiologia, pediatria ou anestesia. Assim faz o calouro dentista que se aprimora em estética dentária, ortodontia ou periodontia. Escolhem especializações decorrentes da sua profissão básica. Nenhum engenheiro civil se especializa em reprodução animal, porque isto não tem nenhuma aplicação prática na sua vida profissional.

Nas Forças Armadas Brasileiras não temos super soldados especializados em pilotar aviões, dirigir carros de combate ou conduzir navios de guerra. Cada instituição militar cumpre a mesma missão de manter a Soberania Nacional, mas de forma totalmente independente.

A especialização de policiais em bombeiros (e vice-versa) aconteceu no Brasil até a Constituição de 1988. O absurdo brasileiro foi corrigido e estas atividades foram desmembradas também pelas Constituições Estaduais de 1989, marcando a independência dos Corpos de Bombeiros Militares estaduais em todo o País.

As Polícias Militares mais tradicionais resistiram à mudança, por isto só São Paulo e o Rio Grande do Sul ainda mantêm esta situação inalterada, apesar dos vários movimentos insurgentes. Insistem na idéia, mesmo sabendo que o mais antigo Bombeiro brasileiro, o do Rio de Janeiro, foi criado independente no ano de 1856. A Bahia e o Paraná já estão em fase avançada de desmembramento.

Este atrelamento à Brigada Militar traz problemas ao Corpo de Bombeiros, com especial destaque à seleção, ao treinamento, aos equipamentos, às técnicas e táticas de salvamento e ao combate ao incêndio.

A seleção não distingue quem tem aptidão para ser bombeiro ou policial militar. Ela mata sonhos porque não é mais possível escolher uma das duas profissões. Quem ingressa na Brigada Militar o faz para ser seu Soldado e servir em qualquer unidade (de policiamento ou de bombeiro) do Rio Grande do Sul. O Soldado que vai servir nos bombeiros não precisa saber nadar. Não faz parte dos pré-requisitos para ser Soldado da Corporação. Como ele vai salvar vidas em perigo nas enchentes, nos rios ou no mar? Talvez isto explique porque 70% dos salva-vidas dos litorais norte e sul são policiais militares que durante quatro meses deixam suas cidades desprotegidas para exercer uma função estranha a sua atividade diária. Em números reais seriam quase 1.200 homens.

Os currículos dos soldados de policiamento e bombeiros foram unificados. Mais de 70% do conteúdo do Curso de Básico de Formação do Soldado Bombeiro é matéria de policiamento. O bombeiro aprende sobre fiscalização de trânsito, mas não recebe nenhuma instrução sobre Defesa Civil. Aprende a atirar, mas não sabe fazer um rapel. Aprende sobre sociologia do crime, mas desconhece como se faz uma respiração cardiopulmonar.

Precisamos corrigir este erro histórico. O modelo de Polícia Militar de 1988 terminou naquele ano. O Corpo de Bombeiros do RS esta atrasado nesta evolução há 24 anos, motivo pelo qual carrega o título de pior bombeiro do país.

Para ilustrar ainda mais estes desencontros profissionais saiba o leitor que atualmente todos os mergulhadores (homens-rãs) são policiais militares, atuando nas unidades de bombeiros em mais um gritante desvio de função. São proibidos por lei de atuarem nos sinistros e nos salvamentos, pois não tem preparo profissional pra tanto. Apesar disto são homens e mulheres abnegados, que mergulham nas frias águas gaúchas, sem equipamento adequado, na maioria particular ou emprestado, pois o órgão “responsável” pela logística da Corporação entendeu que não era prioridade, mesmo depois de insistentes pedidos formais, ou seja, cada um que se vire com o que tem.

No ano passado foram investidos 157 milhões de reais no policiamento e um pouco mais de 3 milhões nos bombeiros. Este valor equivale a 2% do investimento total. A falta de orçamento próprio acumula as razões da separação. A Brigada Militar, a cada ano, devolve cerca de 10 milhões de reais aos cofres públicos por falta de projetos que justifiquem o seu gasto. Com esta sobra os bombeiros poderiam comprar 40 caminhões no primeiro ano de emancipação.

Logo, a minha obviedade chega ao clímax. A Brigada Militar é uma Polícia Militar que realiza policiamento ostensivo fardado, onde o serviço de bombeiro é estranho a esta profissão. Não são antagônicos, mas também não se completam. É um ofício dentro do outro. Quem tem duas coisas pra fazer ao mesmo tempo só tem uma saída: ou faz as duas tarefas de qualquer jeito ou deixa uma em segundo plano para se dedicar à mais urgente. Por isto que a Brigada prioriza o policiamento. É assim que faz, fez e fará. É uma lógica imutável.

Não salvamos mais vidas e não preservamos mais bens por falta de políticas públicas nesta área. A Brigada Militar sempre priorizou o policiamento e cada vez mais deve fazê-lo, pois é uma Polícia Militar que tem esta pesada tarefa constitucional e não podemos condená-la por isto. Faz o que tem que fazer.

Portanto, separar o Corpo de Bombeiros da Brigada Militar é a mais coerente atitude de um administrador e deve ser apoiado por todos. A Brigada Militar não ficará menor e o Corpo de Bombeiros se fortalecerá, melhorando a prestação dos seus serviços à comunidade gaúcha. Já é assim em 25 Estados brasileiros. Desafio alguém mostrar que a população perdeu com esta moderna administração da Segurança Pública nos outros Estados da Federação.

Separar o Corpo de Bombeiros da Brigada Militar significa melhorar a Segurança Pública no Estado do Rio Grande do Sul.

Autor:

DANIEL DA SILVA ADRIANO

Tenente-Coronel RR da Brigada Militar

sammuellacker@hotmail.com.br