Enquanto a maioria dorme, um grupo de profissionais se mantém em alerta para ocorrências, que sempre surgem de surpresa. É que quando o telefone toca, ninguém sabe o que está para ser anunciado do outro lado da linha - a única certeza é que se trata de uma urgência.

No , chamadas de resgate, acidente, incêndios, agressões, homicídios e tentativas de suicídio. Seja qual for a ocorrência, é necessário estar preparado não apenas fisicamente, mas emocional e psicologicamente. Afinal, do outro lado da linha, em algum lugar, alguém precisa de ajuda e conta com esse seleto grupo para receber o apoio que necessita.

"A pressão começa quando tem o acionamento. O deslocamento é muito perigoso, precisamos ficar sempre atentos e não podemos errar. Além disso, o atendimento é uma caixinha de surpresa, só sabemos de fato o que nos espera quando chegamos no local", diz o sargento Luan de Freitas, que está há 13 anos na corporação.

Para o sargento, o tempo de profissão ajuda os militares a lidarem melhor com as emoções. No entanto, combater algumas ocorrências requerem muito mais que experiência.

"Para mim, as piores situações são quando envolvem crianças. Sou pai e é bem difícil quando a vítima é criança. Me lembro de uma ocorrência em que a criança subiu na traseira do caminhão do tio. Ele não a viu e a criança caiu. Ele passou por cima da cabeça dela. Isso foi muito difícil. Nessas horas, precisamos da nossa família do lado para nos ajudar a suportar", relembra.

Descanso para corpo e mente

As escalas de 24 por 72 horas (24h seguidas de trabalho, intercaladas por 72h de descanso) parecem dar um alívio entre uma jornada e outra. No entanto, ainda que estejam de folga, os militares do Corpo de Bombeiros podem ser acionados a qualquer hora do dia ou da noite, e não importa o que estejam fazendo: é preciso interromper a vida pessoal para prestar mais um socorro.

"As jornadas são normatizadas em 24x72, mas no caso específico dos Bombeiros, são tropas de pronto-emprego, ou seja, se ocorrer um grande incêndio, por exemplo, ou qualquer outra situação de calamidade, podem ser acionados", explica o presidente da Aspra (Associação de Praças da  e Bombeiros Militares do Mato Grosso do Sul), Cláudio Benites da Silva.

Não é à toa que, nas profissões cujas atividades são desempenhadas sob constante pressão e risco, é necessário que o profissional receba apoio psicossocial para evitar o desenvolvimento de doenças e transtornos como ansiedade, estresse e depressão.

"O ideal é que estes profissionais que estão sempre sob pressão e lidando com periculosidade deveriam ter acompanhamento constante porque eles estão sempre suprindo as emoções e com o tempo vão sofrendo os prejuízos que podem ser até cognitivos. Eles recebem muita interferência pelo excesso de trabalhos sinistros", explica a psicóloga Almachia Maria de Araújo Zwarg, que atua no segmento há 39 anos.

 
Acolhimento e cuidado

Atualmente, existem 1.556 profissionais na ativa que atendem nos 40 quartéis em funcionamento em Mato Grosso do Sul. Contudo, estima-se que o ideal seria dobrar o número de militares para melhor distribuir o volume de trabalho. Mesmo com a sobrecarga, nenhuma chamada fica sem atendimento.

Assim, para auxiliar os profissionais, a corporação conta com o Serviço Social do Centro de Atendimento Biopsicossocial. Além do trabalho preventivo, o órgão também realiza encaminhamentos para tratamentos específicos. Só em 2022, foram quase 1.400 atendimentos.

"Trabalhamos no acolhimento dos militares que estão em processo de adoecimento. Fazemos encaminhamento para rede de atendimento socioassistencial, inclusive de rede de atendimento psicossocial para ser acompanhado por psicólogos, psiquiatras quando necessário. Fazemos intervenções diretamente com as famílias, buscando construir uma rede de apoios para esses militares, para poder de alguma forma ajudar na recuperação da sua saúde e fortalecer os vínculos quando estão fragilizados, ou desconstruídos", afirma a tenente especialista Luciene Garcia.